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sexta-feira, 28 de março de 2014

Descoberta histórica é feita por dois amigos meus!!

Foi com grande alegria que recebi a notícia de que meus amigos Felipe Braga Ribas e Rafael Sfair de Oliveira entraram para a história da astronomia mundial pela descoberta de uma nova classe de objetos que fazem parte do sistema solar: asteroides com anéis!

SIM! Além dos gigantes anelados, dentre os quais Saturno se destaca, o trabalho que esses dois participaram indica que asteroides também podem ter anéis! A ilustração ao lado é do pequeno asteroide Chariklo e seus dois anéis identificado por eles.

A descoberta foi publicada nessa manhã na revista Nature. Esse trabalho surpreendeu toda a comunidade científica, e está brilhando pelo mundo astronômico tanto quanto super novas pelo universo!

Divulgo nesse post os detalhes dessa grande façanha, e aproveito para registrar minha homenagem a dedicação, talento e esforços de toda a equipe  - PARABÉNS MEUS AMIGOS!



Responda rápido: qual é o objeto que gira em torno do Sol e está rodeado por anéis?

A) Júpiter; B) Saturno; C) Urano; D) Netuno; E) Um asteroide do qual você nunca ouviu falar;   F) Todas as alternativas anteriores estão corretas

A partir de hoje a resposta correta é a opção "F", devido a inesperada descoberta feita por uma equipe de 62 astrônomos mundiais, sendo 11 brasileiros, e dentre eles, meus amigos de faculdade e discussões científicas Felipe Braga Ribas (que chefiou a pesquisa) e Rafael Sfair de Oliveira (que contribuiu com os cálculos relacionados à dinâmica dos anéis).

Os Fatos
Durante suas observações para o Ph.d em astronomia - título mais avançado de estudos de alguém pode alcançar - meu amigo Felipe (que tratarei com muito orgulho e respeito por dr. Ribas) e sua equipe depararam-se com uma observação muito peculiar: em junho de 2013, ao observar a ocultação de uma estrela distante por um objeto que está entre a órbita de Saturno e Urano, notaram duas outras ocultações mais tênues, antes e depois da principal.

O fato inesperado despertou a curiosidade de toda a equipe. Análises posteriores sugeriram que ao redor desse corpo poderia haver outros pequenos objetos, que formariam um anel. Um dos envolvidos na interpretação dos dados foi meu amigo Rafael Sfair de Oliveira (que respeitosamente o tratarei aqui como dr Oliveira), que contribuiu com a análise teórica ("as contas") que auxiliaram na descrição das estruturas.

Desde então, aprofundaram seus estudos e, analisando os dados coletados com o auxílio de outros observatórios pelo mundo, a equipe concluiu que existe um anel formado de gelo e poeira ao redor desse asteroide.

Entrando para a história
Essa foi a primeira vez que estruturas de anéis foram observadas em objetos pequenos - dr. Ribas e Dr. Oliveira, juntamente com os demais membros da equipe, fizeram história com essa comprovação, pois até agora anéis tinham sido observados apenas ao redor de corpos grandes, como Saturno (Júpiter, Urano e Netuno também possuem anéis, mas são muito tênues e por isso não são tão visíveis como o de Saturno). Ao lado uma ilustração dessas estruturas.

As técnicas
Para meus pequenos e demais "leigos" compreenderem, não é olhando para o céu diretamente que é possível ver essas estruturas... Com o uso de um bom binóculos (como o que eu adquiri durante minha graduação com a orientação do dr. Felipe) já vejo muita coisa no céu, mas mal consigo ver os anéis de Saturno... Com telescópios dá para identificar algumas estruturas... mas ainda sim, um asteroide não passa de um fraco pontinho, mesmo para os mais potentes telescópios do mundo.

A descoberta foi feita empregando-se duas técnicas distintas, que se complementaram e revelaram os anéis: a ocultação e a dinâmica de anéis planetários.

Ocultação é uma técnica utilizada em astrofísica para, por exemplo, determinar características físicas como tamanho e órbita de um astro - essa é a área de estudos do dr. Felipe. Ela emprega uma idéia bem simples: ao observar uma estrela daqui da Terra, seu brilho pode diminuir - e até sumir momentaneamente - quando um objeto passa entre a estrela e o observador. E algo parecido com o que ocorre quando colocamos a mão a frente de nosso rosto: ela oculta os raios de luz provenientes de uma lâmpada, por exemplo.

Aplicando essa técnica foi possível determinar o tamanho e forma do asteroide Chariklo, o maior objeto existente dentre os chamados Centauros, grupo de objetos rochosos congelados, com características em comum com asteroides e cometas, espalhados pela região entre as órbitas de Saturno e Urano (ao lado, a localização desse e de outros grupos conhecido de asteroides - clique na imagem para amplia-la).

Conhecido desde 1997, Chariklo tem apenas 250 quilômetros de diâmetro e encontra-se a mais de um bilhão de quilômetros da Terra. Mesmo com os melhores telescópios, um objeto tão pequeno e distante como ele aparece apenas como um tênue ponto de luz.

Além de toda essa dificuldade, um evento desses é rápido - não durou mais que 22 segundos! Sendo assim, quantos mais instrumentos estivessem olhando para o céu mais dados poderiam coletar. Por isso a equipe liderada pelo dr Ribas teve que contar com o auxílio de observatórios na Dinamarca, Chile, Brasil (Observatório da Universidade Estadual de Ponta Grossa, na imagem ao lado, e Foz do Iguaçu), Europa: como a órbita de Chariklo já era conhecida, os astrônomos sabiam que em 3 de junho de 2013 ele passaria em frente da estrela UCAC4 248-10867. No momento exato as lentes de todos eles registraram a ocultação.

Assista o vídeo feito pelo dr Ribas que ilustra o que foi observado durante esse rápido e histórico evento:

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(fonte: ESO)



O objetivo do trabalho não era buscar anéis, mas sim coletar mais informações sobre os asteroides Centauros com sua passagem em frente da estrela. No entanto, acabaram descobrindo muito mais do que esperavam. Alguns segundos antes e depois da ocultação principal ainda houveram duas tênues quedas no brilho aparente da estrela. A imagem ao lado ilustra os dados coletados pela equipe. Isso só poderia significar uma coisa: algo em torno de Chariklo estava bloqueando a luz! Ao comparar as observações feitas nos diversos locais, a equipe pôde reconstruir não apenas a forma e o tamanho dessas estruturas, mas também a espessura, orientação, forma e outras propriedades - e tudo indicou que eram Anéis!

Anéis planetários é a área de formação do dr. Rafael. Seus estudos de doutorado foram especificamente sobre a dinâmica (movimento e interações) das partículas que formam um dos anéis de Saturno (o anel F, o mais externo desse planeta) e os de Urano.

A descoberta
Foi uma grande surpresa para os astrônomos de todo o mundo! Nunca ninguém havia imaginado que pequenos também poderiam ter anéis!

O esquema abaixo ilustra Chariklo e seus anéis no momento da ocultação. As linhas pontilhadas mostram as sombras captadas pelos diferentes observatórios envolvidos. As linhas verdes mostras as regiões observadas dos anéis. A seta indica a direção da luz proveniente da estrela ocultada.



Em entrevista ao jornal Estadão: “Não estávamos à procura de anéis, nem pensávamos que pequenos corpos como o Chariklo os poderiam ter, por isso esta descoberta - e a quantidade extraordinária de detalhes que obtivemos do sistema - foi para nós uma grande surpresa!”, diz Felipe Braga-Ribas  (Observatório Nacional/MCTI, Rio de Janeiro, Brasil), que preparou a campanha de observações e é o autor principal do novo artigo científico que descreve estes resultados.


A equipe descobriu que existem dois anéis ao redor do asteróiode, com apenas sete e três quilômetros de largura, separados entre si por um espaço vazio de nove quilômetros - e tudo isto em torno de um pequeno objeto com 250 quilômetros de diâmetro que orbita além da órbita de Saturno.Veja uma animação dessa estrutura:


Os líderes do projeto deram aos anéis os nomes informais de Oiapoque e Chuí, rios se próximos aos extremos norte e sul do Brasil, respectivamente. Os nomes oficiais ainda serão confirmados.

Tente se imaginar num lugar desses: como será estar sobre a superfície deste corpo gelado, tão pequeno que um carro esportivo veloz poderia atingir a velocidade de escape e lançar-se no espaço... e olhar para cima para um sistema de anéis com 20 quilômetros de largura e situado 1,000 vezes mais próximo do que a Lua está da Terra...


Divulgação
Eu diria que essa foi a notícia astronômica do ano - até agora (rsrs).

Jornais impressos e televisivos veicularam notícias sobre a façanha (veja lá em baixo as fontes que utilizei para escrever esse post). Segue abaixo o vídeo de divulgação da Agência Espacial Européia (ESO) que ilustra com animações a descobertas, e descreve a sua importância (em inglês).





Resultados
Por que essa descoberta é tão importante?
Se está pensando nisso - parabens!!! Você está indo pelo caminho certo!

Embora muitas questões permaneçam ainda sem resposta, os astrônomos pensam que este tipo de anel deve ter se formado a partir dos restos deixados depois de uma colisão. A animação abaixo mostra como poderia ter sido isso:



Os restos teriam ficado confinados como dois estreitos anéis devido à presença de pequenos satélites, que supostamente existem nessa região. “Por isso, além dos anéis, é provável que Chariklo tenha também, pelo menos, um pequeno satélite à espera de ser descoberto”, acrescenta Felipe Braga Ribas.

Os anéis poderão mais tarde dar origem à um pequeno satélite. Tal sequência de eventos, a uma escala muito maior, pode explicar a formação da nossa própria Lua nos primeiros dias do Sistema Solar, assim como a origem de muitos outros satélites em órbita de planetas e asteróides.

O trabalho pode inclusive dar pistas sobre as origens  e os mecanismos que ajudaram a criar nosso planeta, e o processo que permitiu o surgimento da vida!

Achou pouco? "Aparentemente, os mesmos mecanismos dinâmicos que explicam os anéis dos planetas gigantes atuam nos de Chariklo, mesmo que sejam ordens de grandeza menores", diz Braga-Ribas. Faz parte dos planos dos pesquisadores seguir adiante com o esforço de caracterizar outros objetos centurianos. "Estamos considerando pedir tempo no Telescópio Espacial Hubble para observar o sistema", conta dr Ribas. "Mas o tamanho dele é equivalente a dois pixels do Hubble, então levaremos as técnicas de imagem ao limite de sua capacidade". Ou seja: observar estruturas como essas pode trazer melhorias até para as técnicas de observações empregadas atualmente!

é... relembrando nossos tempos de faculdade: os caras realmente não são fracos...

Divulgo abaixo o artigo científico “A ring system detected around the Centaur (10199) Chariklo”, de F. Braga-Ribas et al., que foi publicado online na revista Nature em 26 de março de 2014 (em inglês)




Adendo: Sobre fazer ciência no Brasil
Não poderia encerrar esse post sem mencionar que o Brasil é um país com participação crescente nas pesquisas científicas mundiais ( em diversas áreas).

Nosso país é parceiro da Agência Espacial Européia - pelo menos informalmente, pois desdes 2010 o acerto ainda pende por aprovação do Congresso Nacional. Mesmo assim, o consórcio já concedeu direito pleno de uso aos pesquisadores do Brasil. Sem essa parceria nosso país não teria acesso às tecnologias (observatórios e laboratórios) mais modernos do mundo.

Além disso, fazer pesquisas como essas exigem (como tudo mais na vida..) financiamentos, que são muito difíceis de conseguir por aqui. Fazer ciência não é prioridade num país com tantos problemas sociais... Espero que os resultados que dr Ribas e dr. Oliveira (entre outros) alcançaram revelem (mais uma vez) a importância de se investir em formação de ciência - pois quem é que sabe onde estarão os próximos descobridores de outros segredos do universo??



PARABENS MEUS AMIGOS - fico no aguardo daquela exclusiva que me prometeram ein....



Fontes desse post:

Jornais e Revistas:

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